Quero ser Jack White

03/07/2011 12:01

Por Rafael Soal

Desde que o Si é nota musical, todo mundo sabe: entrar na Indústria musical é tão difícil quanto um plebeu entrar para a família real. No início, o talento para a coisa, felizmente, era um fator primordial. Graças a esse filtro, hoje podemos escutar junto com nossos pais um vinil dos Beatles, do Roberto Carlos, do Jimi Hendrix, dos Stones. Mas, veja só, estamos em 2011. Ano inacreditável, que colocou por terra minha afirmação inicial. Vimos uma plebeia se transformar em princesa diante dos nossos olhos, e em tempo real. Mas, no mundo musical, com a chegada da Internet, o talento já não é mais essencial para adentrar o recinto.

Vamos falar de Brasil. No cenário de rock atual, (que, em minha opinião, só existiu por aqui nas décadas de 1960 e 1970), não passamos por uma safra, digamos, bem quista pelo público e tampouco pela crítica especializada. De todo esse barulho imenso, podemos pincelar algumas bandas com talento pra coisa, e outras que, com um pouquinho mais de esforço, podem chegar lá. Nessa segunda opção encaixa-se a Fresno.

A banda gaúcha já tem 11 anos de estrada, mas entrou no mainstream mesmo em 2008, pelas mãos do polêmico produtor-midas Rick Bonadio. De cara, apresentaram um disco fraco: Redenção não assusta, não encanta, e não dá tanta vontade de ouvir de novo. Em 2010, os quatro caras mostraram uma evolução, e trouxeram Revanche. Paparam tudo que é prêmio: VMB, Multishow, esteve em Os 25 melhores discos nacionais pela Rolling Stone... Os rapazes venceram. Mas, pelo menos um deles, o vocalista Lucas Silveira, passou a se achar um Jack White, e criou vários projetos paralelos. E o pior, acha que todos eles são obras fantásticas. Ledo engano.

Para quem não sabe, Jack White é um multi-homem. Mas, antes de sê-lo, é talentosíssimo. Toca em duas bandas (Racounteurs e Dead Wheather), e era o homem de criação do White Stripes, uma das grandes referências musicais do início do século. Isso sem contar as muitas contribuições que faz em discos de amigos de profissão. Não é a toa que ganhou o posto de décimo sétimo melhor guitarrista de todos os tempos pela Rolling Stone americana.

Pois bem, voltemos a Lucas Silveira. Não contente em ter ingressado no quase impossível mercado musical, em 2010, lançou seu primeiro projeto solo: o Beeshop. Até aqui tudo bem, o disco é bom e vale a pena ser ouvido. Todos os instrumentos (exceto bateria) foram tocados pelo próprio Lucas, a produção foi do Lucas... A crítica gostou. Já em 2011, em apenas um semestre, o vocalista da Fresno lançou dois projetos paralelos praticamente simultâneos: o SIRSir e o Visconde. O primeiro é de música eletrônica, e confesso não ter nenhum embasamento no assunto para dar minha opinião. Mas o segundo, nas palavras do próprio autor, “uma mistura de Radiohead e Los Hermanos”, é muito, mas muito ruim. As dez músicas do projeto foram disponibilizadas no www.soundcloud.com/visconde, e muitas foram campeãs de audiência do site. Mas não dá pra engolir. O material foi todo feito em casa, sem muito cuidado, e as letras dão certa vergonha. A sorte de Lucas são os quase 451.000 seguidores no Twitter. Eles bombaram o site em prol do ídolo.

Isso é uma das consequências da Internet: qualquer um de nós pode fazer uma canção (mesmo que tosca) e postar. Tentar a sorte. E, por vezes, o filtro da Internet somos nós mesmos, e, infelizmente, estamos todos com defeito nesse quesito. Mas isso é história para outra coluna.

Por ora, se tiver curiosidade, entra no SoundCloud do Visconde e concorde comigo. Ou não. Uma dica? Evite comentários duros. Lucas Silveira quer seguir o caminho de glórias de Jack White, mas passa longe do caminho de humildade da Irmã Dulce.